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Eram os Deuses Gerentes de Projetos?

Esta é uma questão polêmica, mas, que nos faz pensar, em como determinados cargos que assumimos, mudam nossa percepção sobre a realidade, nos fazem achar que somos alguém além de meros mortais. A Gerência de Projetos vem por um longo tempo se utilizando de ciclos de vida preditivos, são aqueles projetos orientados a um planejamento prévio, pois possuem uma entrega muito bem definida e conhecida em termos de produto. Neste contexto, os Gerentes de Projetos planejam, elaboram e estimam os Projetos, às vezes com 2, 3, 4, 5 mil ou mais linhas de cronogramas, com seus respectivos: prazos, escopos, recursos, custos, pessoas, riscos, comunicação, integração, dentre outras coisas. Esta fase de planejamento consome um tempo bastante considerável, acreditando-se que assim tudo irá se realizar como o planejado. Muito parecido com o que acreditamos, ao imaginarmos os Deuses, aqueles da mitologia grega, fazendo seu planejamento para tudo que vai acontecer no futuro.

Pois bem, perguntemos então: Será que somos realmente Deuses ou Gerentes de Projetos? Será que tudo isto que foi planejado, vai se realizar conforme previsto? Tudo irá se realizar dentro dos prazos, dos custos e da qualidade desejada? Será que tudo será entregue conforme definido no planejamento do Projeto? Será que vivemos em um mundo perfeito que não muda, que sempre conspira a nosso favor? Será que temos controle de tudo e de todos?

Quando saio de casa falo: “Hoje vai acontecer isso, aquilo e aquilo outro”. Todos sabemos que não é bem assim, isto não é verdade, acontece um engarrafamento, uma chuva, um pneu furado, não se encontra vaga, alguém pede para você ir ou fazer algo que não estava previsto, atende-se a uma emergência, resolve-se um incidente, etc. Estou falando do curto prazo de um dia, você já imaginou o que acontece com o que planejamos a médio e longo prazos, o considerável risco disto não se realizar como planejado. Mas ao desempenhar o papel de Gerente de Projetos atuando de forma tradicional, clássica e preditiva ele está fazendo o que deve ser feito. Existem alternativas tais como planejar, executar e entregar em fases cascateando o projeto, mas apesar do risco diminuir ele continua existindo. A principal questão é o fato de se planejar tudo no início do projeto ou fase, definindo-se o todo, e ao final, com tudo calculado fala-se: “Dia tal começa, no marco tal entrega-se aquilo e aquilo e no final isto, o custo total é de tanto, o projeto é viável segundo seu fluxo de caixa, diante a seu valor presente e a respectiva taxa interna de retorno”. Pois então, este é o preço da proposta, que pode ser fechada para entrega do que foi pedido. Os riscos são estes e temos ações para contorna-los e mitiga-los.

Tudo isto é fantástico e talvez em outro momento, isto pudesse ser feito, no entanto, hoje sabemos claramente que não somos Deuses, que é melhor sermos humildes, simples e enxutos e parar de sonhar com isto. Ao colocarmos o pé no chão, entendemos que somos seres bastantes terrenos sujeitos a todos os tipos de intemperes físicas, emocionais e virtuais que o mundo nos propicia. No século passado, apesar das várias guerras, não posso falar do século XX sem citá-las, ainda tínhamos um mundo mais previsível, linear, estável e escalável. Era admirável de se ver e prever, tudo acontecia mais pausadamente e sem grandes surpresas, exceto as guerras, parecia-se muito com as linhas de produção que se repetiam continuamente. Entretanto, o mundo mudou, ficou muito complexo devido ao avanço da tecnologia e do acesso fácil a comunicação e a um volume enorme da informação para todos devido à internet. Se não basta-se, estamos ainda vivendo um momento ímpar no mundo, a indústria 4.0, a transformação digital, inovações disruptivas, startups que surgem em algum lugar e que rapidamente se propagam para todos lugares do planeta Terra. Parece-nos, então, que a capacidade de sermos Deuses foi embora, ela não existe mais em nós e não conseguimos mais lidar com a previsibilidade diante este novo contexto. O que está acontecendo? Os Projetos mesmo bem geridos, fracassam, em termos de prazos, custos, qualidade, comunicação, integração, etc.

O que citei acima tornou-se mais comum nos projetos de desenvolvimento de software devido as suas peculiaridades, estas criam incompatibilidades de difícil adaptação ao lidar com este modelo tradicional de gestão de projetos diante às várias possibilidades, que a complexidade do mesmo propicia, ou seja, os clientes mudam de ideias no decorrer no tempo. Qual o problema disto, é que o planejamento do projeto é feito no início, como já citei, sendo fechado o escopo, mudanças, portanto, passam a não ser bem-vindas. A insatisfação das partes aparece, tornando o projeto palco de vários problemas: atrasos nas entregas, alteração de escopo, problemas de comunicação, recusas de homologações e aceites, questões financeiras relacionadas a custos, recursos, pagamentos, dentre outras coisas.

Um grupo de 17 profissionais que atuavam, nesta época, com projetos de desenvolvimento de software se reuniram em Utah nos EUA em 2001. Nesta reunião definiram e assinaram então o Manifesto para o Desenvolvimento Ágil de Software, segue parte do mesmo, as quatro frases, nas quais, se valoriza mais o que está à esquerda: Indivíduos e interaçõesmais que processos e ferramentas; Software em funcionamento mais que documentação abrangente; Colaboração com o cliente mais que negociação de contratos; Responder a mudanças mais que seguir um plano. Nasce, então, com seus valores, princípios e práticas, o AGILE ou ÁGIL alinhado a este manifesto.

O Scrum é o framework de práticas Ágeis, mais usado no mundo, tendo sido criado por Schwaber e Jeff Sutherland, que também estavam na reunião que criou o Manifesto Ágil. O Scrum possui sua dinâmica de ser, sua execução é dividida em iterações que podem ser de uma a quatro semanas e são chamadas de Sprints. A cada Sprint existem entregas incrementais de valor para o cliente. Como as mesmas são definidas e estimadas para serem realizadas e entregues no curto prazo, os riscos de não se realizarem diminuem. O Scrum tem como principais características ser: adaptativo, iterativo, incremental, multidisciplinar, auto-organizado, transparente e colaborativo atuando com equipes e melhoria contínua.

Apesar de ter sido criado para projetos de desenvolvimento de software pode-se também aplicar estas práticas ágeis de gestão em diversos tipos de projetos, cabendo ressaltar que vivemos atualmente em um mundo bastante complexo e que neste cenário práticas ágeis são mais adequadas e eficazes tornando as projetos e as organizações mais responsivas. Os Deuses por sua vez, continuam no céu mas perderam seu cargo na terra, visto que, no Scrum não existem Gerentes de Projetos, apenas os membros (3 a 9) de uma ou mais equipes, sendo que dois deste membros que assumem para cada equipe os papeis de: Scrum Master (Facilitador e Líder Servidor) e o Product Owner (Cliente o Dono do Produto). Concluindo, o mais importante é ter o discernimento para decidir o que é melhor utilizar, diante a demanda do projeto, se uma abordagem tradicional prescritiva ou uma ágil adaptativa, o que existe de melhor, é chegar no final, com a equipe e o cliente satisfeitos com o produto entregue.

Se você tem interesse em saber mais sobre o SCRUM, no dia 03/05, das 09h às 11h, eu estarei coordenando o evento “Debate UBQ – Seja Ágil com o SCRUM”. Saiba mais sobre o evento clicando aqui.

(Foto por Nils Huber – Unsplash.com)

SOBRE O AUTOR


FOTO SERGIOSÉRGIO MOTTA

SCRUM Coach autônomo e especialista III em provedor de serviços de TIC, possuindo mais de 30 anos de experiência em empresas privadas e públicas, nacionais e multinacionais de TI com atuações na Gestão de Serviços, Projetos, Melhoria Continua. Certificado em ITIL Expert, ITIL Service Manager, SCRUM Coach, SCRUM Master, DevOps Coach, COBIT, Scrum Fundamentals e Six Sigma Yellow Belt. Formado em Administração, MBA Executivo em Governança de TI e pós-graduado em Engenharia de Telecomunicações, Administração de Sistemas de Informação e Gerência de Projetos. Estudioso, pesquisador e implementador de práticas inovadoras de gestão e estruturação organizacional.

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